Critica-se a CAPES (Coordenadoria de Aperfeiçoamento do Pessoal de Ensino de Superior) e o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico) por algumas decisões no que se refere a financiamento de pesquisa.
Esses órgãos privilegiam a publicação de artigos como produção científica, e a publicação com quantidade e em periódicos de qualidade é fator primordial na avaliação do pesquisador para a obtenção de financiamento.
Para alguns, como o colega Gerson Martins, cujo texto circulou entre os sindicatos vinculados ao ANDES, os artigos não possibilitam a devida interlocução com os pares, o que é promovido pelas comunicações e publicação de trabalhos em eventos científicos, cuja pontuação, para os órgãos financiadores é pouco relevante.
Temos que reconhecer que, ao menos nas Ciências Humanas e Sociais em nosso país, ainda sofremos de uma cultura em que todos tem muito a dizer e poucos estão ali para efetivamente ouvir e debater. Isso se reflete nos periódicos, em que ainda é pouco comum escrever artigos debatendo artigos de colegas. Soa deselegante, e não estamos acostumados. Então, os periódicos são pobres em interlocução por falta de hábito em nossa comunidade científica, não porque seu formato não permita o debate.
Como a avaliação dos pesquisadores, no final das contas, não é feita exatamente pela CAPES ou CNPq como instituições, mas por pares, a pergunta é sobre qual resultado - o artigo ou a comunicação em um evento - é alvo de maior rigor em sua avaliação, tornando-se um produto mais valorizado.
Num Congresso, o comitê científico trabalha, salvo raríssimas exceções - dando pareceres em grandes quantidades e não poucas vezes sobre resumos (ainda que esta tendência esteja sendo revertida nos encontros mais consolidados). O avaliador tende a ser mais condescendente porque os trabalhos geralmente são de caráter mais imediato, pesquisas e reflexões em elaboração. Nos periódicos, a avaliação pelos pares é mais rigorosa: o volume por parecerista adicionado ao fator tempo é favorável a uma leitura mais detida e criteriosa. O avaliador tende a ser mais rigoroso e a exigir resultados consolidados e uma reflexão bem acabada.
Já a publicação de livros, tão típica das Ciências Humanas, tem estado "na mira" dos comitês da CAPES (nossos pares, não nos esqueçamos) por um motivo óbvio: é possível ao autor pagar a própria edição sem passar por um comitê editorial rigoroso. Mesmo um comitê editorial famoso não garante o rigor: se eu for amigo do editor ou se ele me deve algum tipo de favor ou consideração, o livro pode dar a volta à avaliação e sair por uma editora famosa e bem avaliada. Se isso ocorre com um periódico, ele perde totalmente a credibilidade. Com os livros, isso não chega a ser raro.
Não é por isso que os encontros vão acabar. Pelo contrário, eles têm crescido cada vez mais. E se especializado, também, havendo oportunidades para interlocução em todos os níveis da carreira. O caráter de espaço em que se fazem novos contatos com pessoas de nossas áreas de interesse não se perde. Além disso, na era do e-mail, do skype, das mensagens instantâneas, a comunicação e a colaboração entre os pesquisadores acontece em um outro nível. Um pesquisador trancado em seu gabinete pode estar em intensa comunicação com outros pesquisadores, e é geralmente o que estamos fazendo. Esvaziar nossa caixa de mensagens é um eterno "sonho de consumo".
Penso que o problema é outro. Numa abordagem produtivista de ciência, o pesquisador tende a tornar-se um imbecil especializado. Não tem tempo para participação política, sindical, cultural, não valoriza o envolvimento nas discussões e na disputa de espaços para definição dos rumos da universidade e da sociedade. Não lhe interessa trabalhar pela vulgarização do conhecimento científico. Um intelectual despolitizado, aí é que está o grande problema.
2 comentários:
Participar de um congresso vale muito pouco. Realizar uma oficina com professores da rede pública, menos ainda. A não ser que você transforme a oficina em um artigo, cuja escrita demandará horas e horas de trabalho, que serão retirados do seu contato com os professores, que não têm espaço, nem tempo, para produzir um relato de experiência que seja. Agora só falta começarem a exigir dos professores do Ensino Básico (além de ser pais, psicólogos, enfermeiros e amigos) também a produção de artigos. Interessante, exige-se tantas coisas extras dos professores que eu até esqueci de colocar o "ensinar" na lista de exigências. Talvez isso seja "o de menos". É, não é à toa que Arendt e Rüsen citam tantas vezes o mesmo trechinho de Shakespeare...
OK, Carol, só que estamos falando da avaliação e financiamento de projetos de professores universitários.
Avaliação do professor do ensino básico é diferente, e deveria ocorrer de modo que os critérios fossem discutidos amplamente (como ocorre com a pós-graduação), inclusive indicando todos os fatores "extra-professor" que afetam o desempenho dele. Acho que seria ótimo se ele pudesse escrever artigos e compartilhar sua preciosa experiência, mas cobrar isso implicaria conceder carga horária. Isso permitiria reconhecer a pilha de obrigações extra que submergem o básico, que é ensinar, que se atribui impunemente ao professor. Avaliar governos e secretarias seria ótimo!
Essa tendência pode levar a um afastamento desses professores do compromisso com a educação básica, e um dos esforços para corrigir isso é o item "inserção social" de avaliação dos programas de pós-graduação em Educação (pelo menos). Por outro lado, cursos, assessorias, pareceres, etc, que eles devem fazer, têm que ser remunerados. Aí, cada um resolver que prioridade quer dar à sua carreira em cada momento de sua vida.
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