segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Reprovação, punição e recompensa

Vivemos um tempo que que se superou, na escola, o recurso à reprovação. Ótimo. Vivemos um tempo em que a indisciplina na escola tem poucos precedentes no passado, o que inclui a banalização da violência contra o professor. No meu ponto de vista, as duas coisas estão ligadas.
Com a retirada do poder de punição que o professor dispunha através da reprovação, parte importante da sua autoridade também foi retirada. Isso não democratizou a escola, porque democracia não é ausência de ordem (embora não seja qualquer ordem que vá significar democracia). A apatia é generalizada, em parte porque tanto faz se o aluno estuda ou não, se o professor ensina bem ou não. O resultado é essencialmente o mesmo.
Escreveu-se em nome da democracia, um novo capítulo da filhocracia, que precisa ser repensado. Retirando-se a punição, retira-se a recompensa. Estimula-se a contravenção, já que os valores não são claros ou conseqüentes, e isso transborda para a sociedade.
A recompensa deve ser dar menos tempo de aula para quem vai bem, encerrando o período letivo mais cedo para estes, mantendo-o para os demais, com tratamento especializado, por mais tempo. E reprovando, sim, quem não mostra disposição de aprender, pois esses desafiam - não só com a atitude, mas com seu exemplo - o sistema que sustenta a idéia de que é preciso esforçar-se e aprender. Estou falando do "vagabundo", não de quem tem dificuldades de aprendizagem, e o professor minimamente experiente logo distingüe um do outro. COm essa medida, o aluno esforçado é premiado, o aluno relapso é punido, a reprovação é último recurso e quem tem dificuldades de aprender.
Se os pais dos alunos não podem ter os filhos em casa antes do tempo, se cabe ao Estado mantê-los na escola, nada mais certo que ampliar o corpo docente contratando professores que possam orientar leitura, promover lazer e atividade físicas, criar oportunidades de criação e fruição de manifestações culturais em geral.
É isso mesmo, educação de qualidade não se resolve com boa vontade: custa caro mesmo!

domingo, 30 de novembro de 2008

EUNICE DURHAM: ATÉ UM RELÓGIO PARADO DÁ A HORA CERTA DUAS VEZES POR DIA!

Há problemas nos cursos de Pedagogia? Com certeza, a começar pela definição de sua identidade. Há problemas na relação entre os pedagogos e os demais licenciados na escola? Sim, certamente, e isso tem que ser trabalhado. Mas identificar isso à posição de esquerda dos cursos de Pedagogia é uma bobagem rematada. Parece que Durham se convence com os papéis que leu (as Diretrizes Nacionais) e não conhece o "chão da fábrica" da graduação e da pós-graduação em Educação, em que "democrático, participativo, dialógico e decidido em assembléia" não são características em excesso, mas adjetivos ainda a conquistar, em grande parte. É que ela pensou que a análise dos papéis da política pública são a própria política pública, que o currículo escrito corresponde ao currículo praticado.
Mas até um relógio parado dá a hora certa duas vezes ao dia. No final da página 20 ela declara, com toda a razão:
"Na prática, tantas são as alçadas e as exigências burocráticas que, parece inverossímil, um pesquisador com uma boa quantia de dinheiro na mão passa mais tempo envolvido com prestação de contas do que com sua investigação científica." Mas no minuto seguinte, ela volta à carga associando esses problemas à democratização excessiva e assembleísmo da universidade. Não é, professora Eunice. A burocracia não surge da democracia, mas da falta dela, quando os meios se tornam cada vez mais fortes em relação às atividades fins, onde está a maioria, que tem sede de democracia. Ou será que essa situação ocorre só na minha universidade?

A CULPA É DA PEDAGOGIA!

Na Veja (argh!!!) de 26 de novembro de 2008, Eunice Durham (ex-governo FHC) destila um discurso direitista disfaçado de resultado de pesquisa dizendo que os cursos de Pedagogia são o problema, e não a solução para a educação no país. Para ela, os cursos de Pedagogia supervalorizam a teoria e menosprezam a prática (p. 17). Circunscrevem a sua bibliografia a autores da "esquerda pedagógica". Diz um pouco adiante: "Em vez de aprender a dar aula, os aspirantes a professor são expostos a uma coleção de jargões (de esquerda). Tudo precisa ser democrático, participativo, dialógico e, naturalmente, decidido em assembléia" (p. 18)
Posso estar enganado, mas "democracia", "participação", "diálogo" e "assembléia" não são exatamente um patrimônio da esquerda, mas da república e da soberania popular...
A pesquisadora da USP diz que falta autocrítica aos professores, que não admitem o óbvio, de que parte do problema de ensino está na incompetência dos professores que formam. Pelo jeito, Durham não se lembra (é improvável que uma pesquisadora de seu nível não conheça) a bibliografia sobre a formação docente e os trabalhos do GT de Formação de professores da ANPED e dos diversos encontros do ENDIPE, além do trabalho da ANFOPE, entre outros.
Não surpreende. Quem conhece o papel da Eunice Durham no governo FHC já sabe que ela não hesitaria em participar da cruzada "neocon" das Organizações Globo (leia-se Ali Kamel) e da Veja (que foi diário oficial ilustrado do governo FHC).
Quem conhece o trabalho da professora também lembra o papel que o governo do qual ela participou teve na expansão indiscriminada de faculdades particulares de qualidade questionável, fonte de nove décimos dos pedagogos.
Como é que uma pesquisadora tão sagaz não lembra que o curso de pedagogia tem um papel que não unicamente o da formação de professores, mas sobretudo da formação da equipe pedagógica das escolas? Daí a jogar o esquerdismo como responsável pela baixa qualidade da pedagogia, por sua vez responsável pela baixa qualidade do ensino, é só um cômodo e fácil pulinho intelectual.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

DUAS UEPGs

Creio que esse é um problemas de quase todas as universidades públicas no interior do país: o dualismo de sua identidade.
Há uma UEPG Universidade, e uma UEPG repartição pública. Na primeira, as pessoas acreditam que estão em uma instituição de ensino superior que oferece ensino, pesquisa e extensão, com a maior qualidade possível, e projetando sempre mais.
Há uma UEPG repartição pública que está mais preocupada em cumprir os regulamentos em detalhes do que em resolver problemas e solucionar gargalos de desenvolvimento. Para ela, o que interessa são os relatórios administrativos, o respeito à tradição, evitar mudanças a todo custo.
A UEPG repartição é voto cativo para quem está no poder. Cargos comissionados, funções gratificadas, local de exercício da função, são moedas de troca importantes. A chapa que não vence nessa esfera, não chega ou permanece no poder. Desagradá-la é muito perigoso para continuar no poder. Resultado: a UEPG repartição tem, no mais das vezes, mais peso decisório que a UEPG Universidade.
OS OBJETIVOS ACADÊMICOS SÃO SUBMISSOS AOS OBJETIVOS BUROCRÁTICOS. Quando não há escassez de recursos, tudo bem. Quando há, primeiro os meios, depois os fins.
EXEMPLOS? Regime seriado anual ou semestral por créditos? O primeiro, porque é mais simples de administrar e documentar. Embora a maioria dos coordenadores de graduação prefira o regime semestral.
Homologação de candidatura de alunos negros ao vestibular por cotas, antes do vestibular ou logo antes da matrícula? A comissão responsável preferia que fosse antes do vestibular. A UEPG repartição, que continuasse como está. O argumento técnico-administrativo sobrepõe-se ao argumento acadêmico, definindo o campo do possível. E assim por diante.
Até quando os meios vão ser mais decisivos que os fins?

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Cotas na UEPG - Novidades em breve

A Comissão de Avaliação da Implementação da Política de Cotas da UEPG está concluindo os trabalhos referentes a 2007. Nesse período eu presidi a dita comissão.
O relatório sai essa semana e assim que possível eu publico e coloco o link aqui. Entre as conclusões mais importantes, está o fato de que os alunos negros são os que mais sofrem com a evasão dos cursos, mas em diversos cursos - História Licenciatura incluído - a média dos cotistas negros é a maior entre todas as três cotas.
Outro dado é que as médias dos cotistas de escola pública são superiores a todas as outras cotas em mais de 90% dos casos! DERRUBAMOS A TESE DE QUE AS COTAS IAM REBAIXAR A QUALIDADE DO ENSINO!!! É EXATAMENTE O CONTRÁRIO, NA UEPG EM 2007, ELAS ELEVARAM A MÉDIA!!!!
Depois coloco mais detalhes

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Protógenes e Daniel Dantas

Pra quem conhece história: para mim, o Daniel Dantas é para o Brasil do século XXI o que o empresário inglês Percival Farquar foi para o Brasil do século XIX. Ainda bem que no século XXI temos imprensa, liberdade de imprensa, RPM e um chargista porreta como o Maurício Ricardo para fazer esta paródia aqui:
Protógenes canta Olhar 43
Bárbaro!

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

A tirania da CAPES sobre os pesquisadores da pós-graduação

A cada ano, o setor de avaliação da CAPES (MEC) torna mais rígidos os critérios para suas concessões, desde a concessão de bolsas e auxílios até o reconhecimento de programas de pós-graduação (que implica a concessão de um auxílio financeiro anual).
Vários colegas dizem que se trata de uma absurda interferência do governo nas Universidades, que é a reprodução acrítica de uma lógica produtivista e de exploração da mão-de-obra do professor universitário e seus orientandos, ou que é a lógica do capital, e outros chavões pescados na ortodoxia do esquerdismo.
Ora, os comitês de área e os líderes da avaliação da CAPES são acadêmicos. São escolhidos levando em conta a opinião de pesquisadores, programas de pós-graduação e entidades científicas. Não são "eles", somos "nós", por mais que eu possa fazer críticas à representatividade dos membros escolhidos e aos critérios de escolha.
Claro que há uma pressão também sobre os comitês, para que se adaptem a tendências gerais que extrapolam as próprias áreas. Por exemplo, o pessoal da Educação gosta muito dos livros e capítulos de livro na produção de conhecimento, enquanto a linha geral da CAPES vai no sentido de valorizar cada vez mais os artigos em periódicos especializados.
Também podemos dizer que a avaliação por vezes se equivoca. Por exemplo, quando começou a estimular uma maior produtividade, tivemos uma enxurrada de textos de alunos e de colegas publicados em anais de eventos, que sabidamente são menos rigorosos que os artigos. Colegas passaram a ter uma pontuação, em publicações, que era 10 vezes maior do que se esperava para um pesquisador. Mas, ao olhar com calma essa produção, percebia-se muitas vezes uma reciclagem de textos, com mudanças mínimas, para os mesmos públicos potenciais, além de muita "autoria honorária", para usar um eufemismo. Percebendo esse descaminho, o comitê de área diminuiu o peso dos trabalhos publicados em anais de eventos, valorizando os artigos científicos, tanto mais quanto maior seja a qualidade formal e a difusão do periódico. Hoje, o estímulo é para poucos bons produtos.
Em suma, a avaliação é avaliada, e corrige-se.
Estaríamos pior se não tivéssemos controle público (é a República que estabelece o controle sobre os recursos públicos) sobre o setor da Ciência e da Tecnologia. Que o tratamento dos que se comportam como barnabés de repartição fosse o mesmo que o dos que efetivamente agem de acordo com o título de doutor.
Que não nos venham falar de espaço público e restrição às liberdades do capital e valorização dos trabalhadores se não quiserem estar em condições parecidas com as dos demais trabalhadores do nosso país.
Condição de trabalho é outra discussão. Ninguém te dá, você conquista, negocia ou arranca à força.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Cotas na UEPG - Revogação branca

Os mais rápidos que me desculpem o trocadilho do título.
Em 2006, a UEPG fez seu primeiro vestibular com cotas para alunos de escola pública e para alunos negros de escola pública. O debate foi acirrado. A votação no Conselho Universitário foi apertada e a discussão, exaustiva. Mas foi aprovado.
A partir de 2007, por sugestão da CPS (Comissão Permanente de Seleção, responsável pelo vestibular e pelo PSS da UEPG), o critério foi modificado: mantinham-se as cotas, mas estabelecia-se uma nota de corte, ou seja, uma nota mínima para aprovação, calculada com base na média de todas as notas de todos os concorrentes. Em outros termos, as cotas criam três vestibulares: universal, escola pública e negros. Em cada um desses vestibulares, os candidatos disputam as vagas disponíveis para sua cota apenas entre os integrantes da mesma cota. A idéia era que isso garantisse uma entrada maior de alunos cujas médias estivessem um pouco abaixo das médias dos candidatos que comumente eram aprovados, em maioria vindos de escola popular.
Pois bem, com o argumento de corrigir uma distorção de que cotistas negros poderiam entrar com notas muito baixas, estabeleceu-se uma nota mínima (=de corte) que não segue a lógica dos 3 vestibulares concomitantes, mas sim de um índice único. Em outras palavras, a UEPG tem cotas no vestibular na hora de partilhar as vagas para cada setor, mas deixa de ter cotas na hora de definir quem está em condições de ser aprovado.
Resultado? De 2006 para 2007, a quantidade de negros aprovados caiu pela metade. E nenhum deles precisaria de cotas para ser aprovado, já que todos estavam acima da nota de corte. FIM DAS COTAS. Ponto.
Agora a UEPG precisa decidir: ou é uma universidade que tem cotas e pratica isso de verdade, estabelecendo notas de corte proporcionais (uma nota de corte para cada curso e para cada cota), ou assume de uma vez que não quer mais praticas as políticas afirmativas através de cotas, e se descredencia do rol de instituições passíveis de receber verbas destinadas a apoiar as políticas afirmativas.
Do jeito que está, temos cotas só na aparência.

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